domingo, 13 de março de 2016

02 - Ave negra






Ave negra


O difícil regresso das palavras
enredos
memórias de tempos passados
fantasias e caminhos
para onde tento regressar

Céu azul
lenços esvoaçam
ideias perdidas na paisagem
até onde a vista alcança
mãos entretidas em madeixas negras
pescoços alvos onde se enlaçam

Recupero forças,
sou viajante prisioneiro de areias movediças
nenhuma lógica aqui impera
raios ignóbeis, devastação perpétua, privação eterna
existências fúteis, mortiças

O corpo cai na terra escaldante
primeiro, os joelhos
a cabeça tomba
depois, os ombros desistem
fecham-se os olhos do caminhante
sonhos, poeira, fragmentos de alma
centelha, pétala dormente
brilho imperecível, ilusório
milagre soprado pelo vento, partícula pura
braseira irrespirável, reino do astro inclemente

A paisagem ondula
transformam-se laranjas em azuis
morte é vida, é abundância e amor
mimetizam-se nuvens em flores
calor em frescura
o deserto sai sempre vencedor
tempestade, sobressalto,
poder devastador

Eis o regresso do silêncio
tranquilidade impiedosa, estéril, danada
Eis o regresso da carne aos ossos, que foram poeira
silêncio pesado
pássaro aventureiro no meio de tanto nada

Descansa a ave negra
no deserto que alguém sonhou
roda a cabeça, bate as asas, desaparece
viva, sábia, astuta
maior do que as dunas onde repousou

Regressarei a essa casa
concha oca
miragem perfeita, infinita, saborosa
tão difícil de alcançar
pertenço ao deserto, reino de todos os silêncios
este é o meu deserto
feito de palavras difíceis de vislumbrar

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